Nelson Travnik
nelson-travnik@hotmail.com
Todos os anos não há quem fique indiferente diante da
beleza do presépio iluminado por uma estrela ou um cometa. O Natal é sempre um
momento mágico para a cristandade. No presépio são vistos três Magos vindos do
Oriente. De passagem por Jerusalém teriam perguntado: “Onde está o rei dos
judeus recém-nascido? Porque vimos a sua estrela no Oriente e viemos
homenageá-lo”. Assim começa o capítulo dois do Evangelho segundo Mateus. Era
essa a informação que os Magos, sacerdotes do zoroatrismo, religião devida a
Zoroastro que viveu no século VII a.C. e cuja bíblia é o Zend Avesta, possuíam.
Um evento celeste indicava o nascimento de um líder daquele povo, cujos
ancestrais viveram na Babilônia e lá deixaram marcas importantes do seu
monoteísmo antes de voltarem para Canaã e codificarem suas leis. A partir deste
relato, muitas teorias têm sido propostas para identificar a real natureza
daquele evento cósmico. Para que um astro pudesse impressionar as pessoas só
poderiam ser um cometa brilhante, uma estrela nova ou supernova, um alinhamento
planetário, raras conjunções muito próximas entre planetas e estrelas e mesmo a
tese que nenhum fenômeno celeste tenha de fato acontecido. Pesquisas modernas
através de computadores de última geração aliados a representação do céu
daquela época no Planetário, apontam para uma raríssima conjunção tríplice
entre Júpiter e Saturno na constelação de Peixes. Essas conjunções ocorrem
quando ambos estão em oposição ao Sol e devido ao movimento combinado, faz com
que Júpiter cruze com Saturno três vezes. Utilizando o método computacional, a
conjunção foi vista em 1940, 1980 e irá ocorrer novamente em 2238 e 2279. Tendo
em vista que o fenômeno ocorreu em 29 de maio, 1º de outubro e 4 de dezembro do
ano 7 a.C. na constelação de Peixes, é importante lembrar que esta constelação
simbolizava tradicionalmente o cristianismo, dois peixes, um em cima do outro
em sentido opostos. Cálculos mostram outrossim que a mudança equinocial de Áries
(Carneiro) para Peixes ocorreu no ano 54 a.C. Essa conjunção tríplice foi
excepcional, comprovada pelos computadores da NASA, dotados de um software
especialmente criado para perscrutar como as estrelas e planetas se comportaram
àquela época longínqua. A pesquisa mostrou os dois planetas muito próximos um
ao outro, provavelmente menos de 0,5 graus e que, somados os brilhos,
naturalmente chamou a atenção dos Magos. Não somente a constelação de Peixes e
o brilho dos planetas, acrescente-se o significado de Júpiter, poder e Saturno,
realeza. Como sabemos, a estirpe de Jesus era da casa de Davi. Não existe nos
evangelhos uma data precisa para o nascimento de Jesus. A única referência
sobre a “estrela de Belém” é do evangelho de Mateus escrito em aramaico e que
não chegou até nós, pois se extraviou no ano 70 d. C. O certo é que na região
em que Jesus nasceu o frio é intenso em dezembro, janeiro e fevereiro e, por
conseguinte, imprópria para que os pastores permanecessem no campo com seus
rebanhos. A data de 4 de dezembro deve ser, portanto, descartada e com isto a
data de 1º de outubro ou próxima dela merece ser considerada. Como sabemos,
impossibilitada de precisar a data, a Igreja para se impor aos adeptos do
mitraismo, culto pagão a Mitras, o deus de luz dos persas e que era a mais
popular festa romana pagã, colocou o Natal em 25 de dezembro substituindo assim
as Saturnais comemorando o “Natalis Solis Invicti” – Nascimento do invencível
deus Sol – por uma grande festa cristã. Alguns estudiosos acreditam que o nascimento
ocorreu no dia 12 de novembro quando a constelação de Peixes estava sob o
horizonte sudeste de Belém com Júpiter e Saturno em magnífica conjunção. A
história nos diz que o reinado de Herodes, o Grande, na Judéia, estendeu-se
entre os anos 37 a.C. até 4 a.C. como da sua morte em abril/maio. Isto coloca a
conjunção tríplice nos últimos anos do seu reinado. Trata-se, pois, de um
fenômeno celeste notável, de grande significado astronômico e místico para os
Magos e que bem poderia representar uma peregrinação de Leste para Oeste. E que
não eram reis e sim sacerdotes do zoroatrismo, sábios observadores do céu e
muito conceituados entre os medas e persas. Foi um escritor inglês chamado Beda
que em 673 os batizou de Gaspar, Melchior e Baltazar. A tradição da Igreja
considera três por terem sido três os presentes dados ao recém-nascido:
incenso, ouro e mirra, uma resina aromática. Note-se que as igrejas síria e
armênia falam em doze. Sejam estas ou outras hipóteses, é praticamente
impossível determinar com precisão a data de um fato ocorrido há mais de dois
milênios. Seria um transtorno geral, ou mesmo universal, se tivéssemos de
comemorar o Natal não em dezembro, mas em outra época conforme as pesquisas
feitas. O importante é que um fenômeno astronômico extraordinário marcou
indelevelmente a maior data da cristandade, tão relevante que dividiu a
história em antes e depois de Cristo.
Nelson
Travnik é astrônomo e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.
Nenhum comentário:
Postar um comentário