Giordano Bruno
Imagem: nationalgeographic.com.es
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Nelson Travnik
nelson-travnik@hotmail.com
Recentemente o noticiário internacional destacou a
descoberta de um exoplaneta na zona habitável orbitando a estrela Alpha
Centauri C ou, simplesmente Próxima, nossa vizinha no espaço a “apenas” 4,22
anos-luz.
Alpha Centauri é uma estrela tripla : duas são muito
brilhantes A e B e a terceira C é uma massiva anã vermelha apenas com diâmetro
uma vez e meia maior que Júpiter. Com uma magnitude de +11.05 torna-se muito
difícil de ser localizada. Estima-se que gasta alguns milhões de anos para
completar uma volta em torno das suas companheiras A e B. Se a noticia provocou
impacto nos leigos, para os astrônomos não causou nenhuma surpresa uma vez que
em 3000 exoplanetas pesquisados, 68 são próximos ao tamanho da Terra e estão
na zona habitável. Desde a descoberta do primeiro exoplaneta em 1990, seu
número atual está próximo a 5000 e não
para de crescer. Com isto já é aceito que a maioria das estrelas possuem
planetas ao seu redor e, por analogia, também possuirão satélites, asteróides e
cometas. Esse raciocínio leva-nos a conclusão que pode haver civilizações lá
fora que já chegaram a um estágio de desenvolvimento suficiente para emitir
ondas de rádio. Assim sendo, já é aceito que nos próximos 25 anos através das
gigantescas antenas dos nossos radiotelescópios chegará a tão aguarda mensagem: também estamos aqui !
SOMOS POEIRA
DE ESTRELAS
Os cientistas concordam que somos subproduto de água,
terra, luz e outros elementos gerados no interior de uma estrela: o Sol. Dez
por cento do peso médio do corpo humano é composto por átomos de hidrogênio.
Todo o resto é de elementos mais pesados que o hélio, justamente aqueles
produzidos dentro das estrelas. A descoberta de diversas moléculas orgânicas no
meio interestelar, gelo e carbono nos cometas e astros assemelhados, reforça a
idéia de que o universo é um celeiro de vida. A nucleosíntese primordial e a
nucleosíntese estelar produziram elementos que fazem parte dos nossos corpos.
Sim, somos feitos de poeira de estrelas!
O RENASCER
DE UMA IDEIA
ANTIGA
A possibilidade de existir outros mundos com formas de
vida é antiga e na Grécia já se pensava nisso. A Escola de Epícuro (341 -271)
ensinava que não havia nenhum obstáculo para haver infinito número de mundos
parecidos com o nosso. O poeta romano Titus Lucretio (97 -55) defendia igual
pensamento. No século XV o cardeal Nikolaus de Cusa sustentava a pluralidade dos mundos habitados com
anuência do Papa Eugênio IV. Com a reformulação do sistema heliocêntrico por
Nicolau Copérnico (1473-1543), endossada a seguir por Galileu Galilei
(1564-1642) e Johannes Kepler (1572-1630), o fato atingiu em cheio as
“verdades” impostas pela Igreja. Destronar a Terra do centro do sistema solar,
do universo, da criação, indo de encontro aos doutores da Igreja era
inadmissível, uma heresia. O curioso é que já muito antes de Copérnico, o
astrônomo grego Aristarco de Samos (310 -230) demonstrava que a Terra e os outros planetas
giravam ao redor do Sol e que o movimento das estrelas à noite era aparente,
causado pela rotação da Terra. Copérnico salvou-se da Inquisição pois seu livro
propondo o heliocentrismo só lhe chegou ás mãos no leito de morte. Galileu
contudo não teve a mesma sorte e teve que se retratar perante o Tribunal da
Santa Inquisição para escapar da fogueira.
A pena foi abrandada para prisão domiciliar em Arcetri, próximo a Florença. Foi
necessário dois séculos para que a Igreja admitisse oficialmente em 1822 que a
Terra girava ao redor do Sol.
GIORDANO BRUNO ,
MÁRTIR DA CIÊNCIA
Um destino trágico contudo estava
reservado a Giordano Bruno (1548-1600). Fascinado pela imensidão do universo
que os astrônomos de sua época estavam revelando contrapondo ao universo
fechado pela filosofia aristotélica defendida pela Igreja, ele opôs um universo
infinito. Defensor da teoria heliocêntrica de Aristarco e Copérnico, ele chegou
a admitir também a existência de outros mundos.
Em seu livro “De l’ Infinito, Universo e Mondi”, Acerca do Infinito,
Universo e Mundos, ele escreveu : “há incontáveis terras orbitando em volta de
seus sóis da mesma maneira que os seis planetas do nosso sistema”. Para a Igreja
isso soou inadmissível pois era ir de encontro ao que ela defendia. Ademais, se
existiam infinitos mundos, muitos deles habitados, como seria a “salvação” dos
seus habitantes ? Uma réplica do que ocorreu aqui? Giordano Bruno com a coragem dos heróis,
enfrentou com altivez o Tribunal da Santa Inquisição não se retratando de suas
convicções e o que ditava sua consciência.
Foi acusado de ser inimigo de todas as religiões, crer na existência de
outros mundos e na infinidade do universo. Sofreu um processo que durou sete
anos e no dia 9 de fevereiro de 1600, condenado por sua “heresia”, foi queimado
vivo no Campo di Fiori em Roma tendo exclamado antes do suplício : “Minha alma
subirá ao Paraíso junto com a fumaça do meu corpo”. Giordano Bruno, espírito
renovador, alma límpida, apóstolo da ciência do céu, não se deixou intimidar
pelas ameaças vindas de uma Igreja fechada as novas idéias do movimento
renascentista e corroída por escândalos e dogmas que feriam a razão. Passados
416 anos, desde 1990 a astronomia nos vem revelando a pluralidade dos mundos
em nossa galáxia comprovando Giordano Bruno e que a fé nunca
pode estar divorciada dos conhecimentos científicos.
O autor é astrônomo no Observatório
Astronômico de Piracicaba Elias Salum e Membro Titular da Sociedade Astronômica
da França.
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