Para
o leigo, ela é apenas uma esfera de luz que nos ilumina e aquece.
Contudo, essa magnífica estrela situada nos braços de uma galáxia
espiral, a Via Láctea, é um astro que tem uma importância crítica para a
humanidade, pois tudo que existe sob a superfície da Terra é fruto de
uma cadeia energética que começou quando núcleos atômicos se fundiram em
seu interior. Portanto, o que você come, bebe, o combustível que
abastece o seu carro, aquele corpo bronzeado que lhe provoca suspiros,
enfim, sua própria existência é um presente do astro-rei. Somos, por
conseguinte, filhos de uma estrela e recuando ainda mais, da nebulosa
primitiva que lhe deu origem. Isso explica o motivo pelo qual,
intuitivamente, muitos povos antigos viam nele a razão da vida e o
veneravam como deus. O Hino ao Sol do faraó Akhenaton que de um só golpe
derrubou crenças milenares e introduziu o culto a Áton, o Sol, é uma
das mais belas páginas dessa devoção ao astro-rei.
UMA USINA NUCLEAR NATURAL
O
Sol é uma bola de plasma, gás altamente aquecido a temperaturas que não
permite que os átomos estejam ‘inteiros’ e dizemos então que estão
ionizados. Ele é 1.300.000 vezes maior em volume que a Terra e por isso o
seu núcleo é submetido a uma pressão externa da ordem de 340 bilhões de
vezes a pressão do ar em nosso planeta, o que origina temperaturas
próximas a 15 milhões de graus C ! Submetido a essa gigantesca pressão e
temperatura, quatro átomos de hidrogênio se transformam em um átomo de
hélio e este por sua vez em outros elementos. Na fase atual, o Sol é
composto de 71% de hidrogênio, 27% de hélio e 2% de outros elementos.
Isto caracteriza as estrelas amarelas do tipo G, uma espécie comum onde
existem bilhões delas apenas na Via Láctea.
O segredo, portanto, do Sol e das estrelas gerarem energia é de serem usinas naturais de
transformadores de matéria através do processo da fusão nuclear. Para
entendermos esse processo, basta dizer que a fusão de um grama de
hidrogênio libera tanta energia quanto a combustão de 20 mil litros de
gasolina! Agora o leitor está apto a compreender a razão desta corrida
desenfreada pelos institutos avançados de pesquisa de molde a obter a
fusão nuclear do hidrogênio em condições seguras. Estima-se que até 2050
isso será possível o que propiciará a humanidade dispor de uma fonte
inesgotável de energia limpa, eficiente, sustentável e duradoura.
TUDO QUE ACONTECE NO SOL REFLETE NA TERRA
O Sol até certo ponto
comparado a outras classes de estrelas, é um astro bem comportado. Isto
deve-se a uma situação de equilíbrio que é mantido pela força de
gravidade e pela pressão da radiação que flui do seu interior. Essa fase
de equilíbrio e estabilidade só irá alterar quando acabar o hidrogênio
do núcleo. Apesar atualmente de seis observatórios solares no espaço
(SOHO, TRACE, RHESSI, SORCE, STEREO E YOKOHO) e outros tantos em terra
monitorando o Sol em todas as faixas do espectro, podemos dizer que ele
ainda é uma estrela que guarda alguns segredos. Em um período médio de
11 anos, irrompem no Sol uma série de fenômenos ainda mal entendidos,
que causam imensos transtornos ao planeta azul.
No aumento da atividade solar tal como estamos vivenciando agora, surgem
gigantescos agrupamentos de manchas escuras passíveis até mesmo de
serem observadas a olho nu com um filtro indicado ou mesmo sem filtro
protetor quando o Sol está próximo ao horizonte mergulhado a
nebulosidade ou névoa seca. Os chineses foram os primeiros a relatar que
havia manchas no Sol. Em determinados períodos quando isso acontece,
ninguém entende a razão pela qual o Sol inteiro reverte sua polaridade
magnética geral : o pólo magnético norte se torna pólo sul e vice-versa.
Mais estranho ainda é que o campo magnético da Terra também se reverte a
intervalos aparentemente aleatórios. O mais recente foi a 780 mil anos.
As pesquisas mostram
que o Sol é como um coração pulsante, um ser vivo inquieto, palco
constante de violentas convulsões que começam a partir do aparecimento
cada vez maior de manchas em sua parte externa denominada fotosfera.
Associadas as manchas irrompem imensas protuberâncias, flares,
fulgurações e tempestades que liberam feixes contínuos de radiações
altamente energéticas dos tipos ultravioleta, raios X e gama,
extremamente nocivos aos seres vivos e que afetam o clima como está
comprovado por pesquisas arqueológicas e exames nos anéis concêntricos
de troncos de árvores centenárias. Felizmente nossa atmosfera e a
magnetosfera nos protegem contra as radiações mais perigosas. Esse fluxo
de partículas chamado vento solar é que mais preocupa os cientistas,
pois enquanto algumas emissões a uma velocidade de 447,9 km/s levam
quatro dias para chegar a Terra, outras nos atingem em poucas horas,
tempo demasiadamente curto para proteger a frota de satélites de
comunicação, de posicionamento global, alertas meteorológicos, as redes
de energia elétrica e a Estação Espacial Internacional, ISS.
Em 1989 uma
fortíssima ‘Ejeção de Massa Coronal’, CME, provocou sobrecarga e
incêndios nos equipamentos da rede elétrica Hidro-Quebec, Canadá,
danificando e causando prejuízos de milhões de dólares! Em 1999 o
satélite Galaxy 4 foi atingido deixando 40 milhões de usuários sem
televisão além de bloquear contas bancárias. Em 28 de outubro de 2003,
explodiu uma fulguração (flare) de proporções nunca vista nos últimos 40
anos. Felizmente a mega tempestade aconteceu na borda do disco solar e
as radiações atingiram de leve nosso planeta. Mesmo assim, danificou
três satélites japoneses, problemas em vários outros, na “Mars Odyssey”
ao redor de Marte que perdeu um instrumento além de aviões que optaram
por rotas mais ao sul. Na ocasião os astronautas da Estação Espacial
Internacional, ISS, tiveram que se alojar no módulo ‘Zvesda’ que os
protege do nível das radiações. O mundo atual está globalizado, ligado a
uma rede de satélites. Se eles forem seriamente danificados por uma
forte tempestade solar, o mundo pára e
para sua reposição será necessário tempo e bilhões de dólares que irá
afetar a economia de muitos países. Um fato intrigante é que as piores
tempestades solares ocorrem nos anos em que o máximo solar vai
esmorecendo. Até agora ninguém pode explicar porque isso ocorre e nem o
chamado “Mínimo de Maunder”, um estranho período de 1645 a 1715 no qual
praticamente não houve manchas no Sol. Esta diminuição da atividade
solar coincidiu com a ‘Pequena Idade do Gelo’ na Europa. Rios congelaram
e foi possível passear e patinar sobre eles. Por outro lado, não há
ainda explicação convincente para que a chamada atmosfera solar (coroa)
atinja temperaturas que vão a 2 milhões de graus C quando deveria ser
bem mais fria. Esses aspectos compõe um quebra-cabeça ainda longe de ser
montado, razão pela qual o Sol é monitorado intensivamente em terra e
no espaço.
Nelson Travnik é astrônomo, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba SP, e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.
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